Novo modal em Cuiabá e VG: 17 anos de derrotas em série
Dezessete anos. Esse é o tempo que os cuiabanos e várzea-grandenses já ouvem falar da implementação do modal de transporte público denominado BRT (Ônibus de Rápido Transporte), o corredor exclusivo para ônibus.
No ano de 2008, o então governador Blairo Maggi entrou na briga para que o Estado fosse uma das 12 cidades-sedes dos jogos da Copa do Mundo de 2014. A partir deste domingo, o jornal A Gazeta inicia uma série especial sobre esta longa história marcada por decisões políticas, prejuízos à população e incompetência.
Ao inscrever Cuiabá como candidata, nos dados dos projetos de mobilidade urbana incluídos na defesa da cidade já constava a implementação do BRT como principal meio de transporte público para as mudanças estruturais que a cidade passaria para receber os jogos.
Porém, logo após a confirmação de Cuiabá como cidade-sede da Copa, em 31 de maio de 2009, quando a cidade parou para comemorar o feito, uma sombra rondava o BRT, a defesa política do VLT (Veículo Leve sobre Trilhos).
Políticos, especialistas, e otimistas aliaram-se em um movimento para desbancar o BRT, tendo como a principal bandeira a modernidade.
Passados 17 anos, a História é marcada por um rastro de erros, mau planejamento, corrupção e malversação do dinheiro público. A mudança de modal do BRT para o VLT, a tentativa frustrada pela implementação do VLT, a paralisação das obras, o impacto no comércio e em empresas que acabaram falindo, a decisão enterrar o VLT e implementar o BRT, e agora a rescisão contrato com a empresa responsável pela obra 4 anos depois de anunciar a obra, é a herança maldita que se tornou um exemplo de incompetência nacional.
O lobby
Com o grande volume de investimentos em infraestrutura, Cuiabá e Mato Grosso não poderiam perder a oportunidade de optar por um transporte mais moderno e que era o preferido da Europa e dos países desenvolvidos, diziam os defensores do VLT.
Dezesseis dias depois do anúncio da Capital como subsede, em 16 de junho de 2009, o então presidente da Assembleia Legislativa, comandava a primeira audiência pública em Mato Grosso para discutir a viabilidade do VLT.
Desde o início, o governador Blairo Maggi, principal idealizador de Cuiabá como sede da Copa, rejeitava veemente qualquer possibilidade de mudança de modal, alegando falta de viabilidade e por ser mais caro.
“Uma das alternativas para sanar esse problema é a construção do metrô de superfície ligando Cuiabá a Várzea Grande”, disse Riva na audiência apontando estudos e informações prestadas pelos defensores do projeto.
Já os defensores do BRT classificavam a proposta como uma ‘pirotecnia da Copa’. O debate se seguiu, principalmente via imprensa.
Blairo Maggi renunciou do cargo de governador em 31 de março de 2010, com o objetivo de concorrer ao Senado. Em seu lugar assume o vice, Silval Barbosa, que havia sido indicado ao cargo em 2006 pela própria ALMT.
Sem Blairo no governo, o lobby dos defensores do VLT aumentava. Silval é reeleito em 2010, e em 2011 se inicia a ofensiva para a troca de modal. Em fevereiro daquele ano, Riva iniciou uma forte defesa pela viabilidade do VLT. Apresentou ao governador Silval, vários empresários do setor de São Paulo e da Espanha. Diante da pressão, Silval passou a analisar a possibilidade e mudar o discurso, dizendo que, se fosse comprovada a viabilidade, poderia mudar o modal.
Riva utiliza a tribuna da Assembleia, fazendo vários discursos inflamados, atacando principalmente um dos diretores da Agecopa - agência criada para comandar as obras da Copa do Mundo em Cuiabá e Várzea Grande.
O principal alvo foi Yenes Magalhães, defensor do BRT. Riva entrou em rota de colisão com a Agecopa, acusando Yenes e outros diretores. ‘Existe um lobby muito forte, não sei se é político, empresarial e envolve propina’, disse à época. Nessa queda de braço, Riva se deu melhor, e em abril de 2011, o ex-secretário Eder Moraes assumia a presidência da Agecopa. Riva tinha o apoio de outros dois importantes deputados, que hoje são conselheiros do Tribunal de Contas do Estado (TCE): Sérgio Ricardo e Guilherme Maluf.
A troca e a suspeita
No dia 23 de agosto, a então presidente da República Dilma Rousseff (PT), aprovou a mudança de modal para Cuiabá. Antes, vários pareceres apontavam para a inviabilidade.
Após a mudança, veio à tona, em novembro de 2011, que a troca de modal ocorreu por meio de fraude no Ministério das Cidades, onde teria ocorrido a troca do parecer técnico que era contrário à mudança por um outro parecer favorável. A manobra teria sido acordada politicamente entre o governo federal e o governo do Estado.
Cartas marcadas
Em maio de 2012, o governo publicou o resultado da licitação, onde o Consórcio VLT venceu com um custo de R$ 1,47 bilhão. O Portal Uol revelou que 30 dias antes um anúncio publicado no Jornal Diário de Cuiabá, revelava as empresas vencedoras do Consórcio.
O lobista Rowles Magalhães Pereira da Silva, assessor especial do vice-governador de Mato Grosso, adiantou que o consórcio VLT Cuiabá venceria a licitação.
Rowles representava uma empresa de Portugal, e alega que foi traído por integrantes do governo, que havia lhe garantido que a empresa portuguesa venceria.
Em junho de 2012, Estado assina contrato com o Consórcio VLT Cuiabá com objetivo de estar funcionando em abril de 2014. A Copa de 2014 se foi, os chilenos também e os alemães levaram a taça.
Em dezembro daquele ano, o governo Silval determina paralisação das obras, alegando atrasos no cronograma, entre outros problemas. O contrato foi paralisado com 30% das obras físicas feitas e gasto de R$ 1,066 bilhão.
Em abril de 2015, sem entendimento para retomar as obras, ação conjunta do Estado e dos ministérios públicos Estadual e Federal resulta na suspensão judicial do contrato. Já em janeiro de 2016 a empresa de consultoria KPMG apresenta relatório apontando R$ 602,7 milhões como o valor necessário para concluir as obras. O consórcio pedia R$ 1,2 bilhão.
Porém, em agosto do mesmo ano, a Operação Descarrilho da PF, para investigar suposto pagamento de propina por parte do consórcio ao ex-governador Silval Barbosa, o governo estadual já sob o comando de Pedro Taques decidiu rescindir o contrato unilateralmente com as empresas do VLT.
A 2ª troca
Logo que assumiu o governo, Mauro Mendes disse que em um ano resolveria o ‘problema VLT’. Tendo como padrinho político Blairo Maggi, defensor do BRT, ouviu a opinião que o melhor seria a troca de modais. Mendes buscou o governo federal para viabilizar um estudo para saber qual a melhor alternativa. Apesar disso, desde o início o seu governo optou pelo BRT, pela troca. Contudo, o estudo técnico do Ministério das Cidades em 2020, apontava que o projeto de menor risco, seria a conclusão do VLT em um escopo reduzido, ou seja, com menos paradas e estações, pelo valor de R$ 760 milhões. Já a troca de modal, teria maior risco.
Mas, em dezembro de 2020, Mendes anuncia a substituição do VLT para o BRT.
Após o anúncio e com a Assembleia em suas mãos, aprovou a troca de modal. Em abril de 2022, o governador homologou o resultado da licitação em abril deste ano, no valor de R$ 468 milhões.
Em dezembro, a empresa do Consórcio Construtor BRT Cuiabá começa a retirada das estruturas que serviriam como suporte para cabos energizados do VLT no município de Várzea Grande.
Porém, passado 4 anos do anúncio, o governador decidiu rescindir o contrato com o Consórcio do BRT, já que a obra tem apenas 18% de sua execução.









